sexta-feira, novembro 28, 2008

Lomografia: Guiné-Bissau | Lomography: Guinea-Bissau


Não é fácil comentar esta fotografia...
... não sei se porque tem um círculo que me faz lembrar o mundo onde alguém está a partilhar o que tem, sendo essa uma situação contrastante com o que acontece na realidade, ou se porque me faz lembrar que quem partilha é sempre quem tem pouco para dar.

Quem tem muito não quer dar o que tem... talvez porque o que tem seja demasiado valioso...
Quem tem pouco não se importa de partilhar o que tem... será que isso quer dizer que o que tem, não tem valor?

Vi esta semana um documentário sobre Imigração ilegal - Bab Sebta. O documentário ganhou o último DocLisboa.

Uma das frases que memorizei foi a de um africano [não me lembro se era do Mali ou de outro país]:
"(...) os africanos tentam entrar na Europa à procura de melhores condições de vida, à procura de dinheiro. Vocês, europeus, vêm a África, não à procura de dinheiro nem de melhores condições de vida. Vêm à procura de conhecimento."

Outro disse outra coisa extraordinária:
"No séc. XV, os europeus vieram pelo mar até África. Nós agora, queremos ir pelo mar até à Europa e não nos deixam."

...

Voltando à imagem de cima, só consigo pensar numa coisa: nós continuamos a ir a África buscar coisas, neste caso, conhecimento, sabedoria. Em troca, as pessoas dão-nos o que têm... seja muito , seja pouco...


... estou certo que já recebi muito mais do que dei...




quarta-feira, novembro 26, 2008

Lomografia: Guiné-Bissau | Lomography: Guinea-Bissau


As grades são as mesmas da lomo anterior. Em tempos estas grades foram de cimento... o desenho era o mesmo, mas com o tempo foram ruindo até que caíram. A necessidade falou mais alto e umas grades de ferro foram ali colocadas.

O Centro de Recuperação Nutricional fica mais "leve" visualmente e, assim, são várias as crianças que por ali andam a ver os bebés a serem pesados e alimentados.

Não sei quem é a rapariga que ficou registada, mas conheço bem as grades que a separam de mim... essas grades são difíceis de derrubar, embora sejam maiores os espaços vazios que me permitem trespassá-las...

Esta lomo retrata bem o que se passa no nosso mundo:
Nós do lado de cá, com todos os meios para fazer alguma coisa. Eles do lado de lá, mas com a vontade de dar o primeiro passo, esticando as mãos para fazer algo, nem que seja o agarrarem-se à fronteira que nos separa...


sábado, novembro 22, 2008

Lomografia: Guiné-Bissau | Lomography: Guinea-Bissau



Estreio hoje o blog com fotografias lomográficas da Guiné-Bissau. O rapaz sentado chama-se Maio e trabalha no Centro de Recuperação Nutricional de Empada.

Comprometi-me com ele a tentar arranjar alguém que o ajudasse a estudar... o que ganha ali não chega para tirar um curso superior de Enfermagem ou Medicina na capital, Bissau.

O Maio foi o melhor aluno das aulas de Português que eu e a Ketta demos lá em Empada.

Para conseguir estudar em Bissau, ele precisa de cerca de 30 euros por mês.

Vou começar, a partir de Dezembro, a colocar um euro de parte por semana para angariar o valor necessário. Se conseguirmos angariar o suficiente, as pessoas que forem a Empada no próximo Agosto poderão levar o dinheiro necessário para o Maio poder estudar e vir a ser um enfermeiro, ou até quem sabe, um médico.

Quem quiser juntar-se a mim é só deixar um comentário ou enviar-me um mail...

Só precisamos de 12 pessoas para este micro-projecto. Aqui fica a lista:

01 - Mário Linhares (22.nov.2008)
02 - Lavínia Leal (24.nov.2008)
03 - Maria Cabral (24.nov.2008)
04 - Cristiana (24.nov.2008)
05 - Luís Giestas (25.nov.2008)
06 - Paula Xavier (25.nov.2008)
07 - Patrícia Pedrosa (26.nov.2008)
08 - Mafalda Cavalheiro (27.nov.2008)
09 - Marisa Marcelino (29.nov.2008)
10 - Joana Nascimento (01.dez.2008)
11 - Marta Teives (02.dez.2008)
12 - Martha Xavier (02.dez.2008)


Vídeo: Guiné-Bissau | Video: Guinea-Bissau



A 31 de Julho, quase no final do dia, gravámos o webdiário com as irmãs missionárias da Consolata.


sexta-feira, novembro 21, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau


"Venham rápido ver as crianças a subir à palmeira" - dizia a Ir.ª Franca a mim e à Patrícia que estávamos no Centro Nutricional.

Estava uma palmeira com um "cacho" de bagos de óleo de palma pronto a ser colhido. Uma criança de 10 ou 11 anos começou a subir. Colocou uma fita (feita das folhas da palmeira) à volta da cintura e passou-a por detrás da palmeira. Aos poucos lá ia subindo... numa das mãos levava uma catana para conseguir cortar o cacho...
... chegado lá acima esforçou-se ao máximo para cortar as folhas à volta e assim chegar ao cacho. Esgotadas as forças após alguns golpes infrutíferos, decidiu descer...

Pensei para mim: "gostava de o ver a arrancar o cacho... que pena"

Passados uns minutos chegou o irmão mais velho. Talvez tivesse 17 ou 18 anos. Subiu de forma mais ágil e, com mais habilidade, conseguiu separar o cacho da palmeira! Pegou nele e atirou-o cá para baixo! Mal caiu, as crianças começaram a tirar pequenos bagos e a colocá-los na boca. Uma delas virou-se para mim e ofereceu-me um...
... não resisti à tentação de provar um bago de óleo de palma acabadinho de colher da palmeira. Não fazia a mínima ideia do gosto que ia provar, se tinha caroço ou não, se ia gostar...

Sem pensar muito coloquei o bago na boca. A minha primeira sensação foi:
"que caroço tão grande"!
Na realidade a parte que se aproveita deve ter uns 2 ou 3 milímetros de espessura.

Os meus dedos ficaram vermelhos só de pegar no bago...
O sabor não é mau, mas é muito oleoso...
A parte comestível é muito fibrosa... fica nos dentes...

As crianças riram-se mais uma vez de mim, mas fiquei orgulhoso por ter comido do mesmo cacho que eles...


quinta-feira, novembro 20, 2008

quarta-feira, novembro 19, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau


A Arte respira-se em todo o lado... e os artistas precisam desses lados todos, desses pequenos detalhes, fragmentos, nadas...

Passear pelos caminhos de Empada leva-nos a reparar nesses detalhes, nas novidades visuais...
Já aqui escrevi que as paredes das casas são belas...


Quando olho para esta fotografia nunca sei bem o que escrever... gosto da fotografia, do enquadramento, da rapariga que posa propositadamente para mim, mas não sei... fico sempre sem palavras...

terça-feira, novembro 18, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau



Nesta terra castanha pousam-se colchões de espessura tão fina que nem percebo como ainda resistem...
Este é o quarto dos filhos mais novos da Safi. No colchão branco dorme o Idrissa, único rapaz da família que deve ter 13 ou 14 anos. No colchão que tem uma manta aos quadrados brancos e vermelhos, dormem a Cadijia, a Franca e a Aissato.

Quando no documentário surge a Aissato no Hospital porque um bicho branco lhe tinha entrado no dedo, toda essa situação parece tão irreal que não se percebe como pode acontecer. Ao ver esta imagem talvez se perceba melhor como três crianças a dormirem juntas no mesmo colchão (que está no chão) ficam sempre sujeitas a situações dessas ou piores...

O mais surpreendente no meio de tudo isto é a alegria das crianças quando estão connosco. A forma como se riem para nós, como parece que tudo aquilo que têm é suficiente...

Uma das memórias visuais mais bonitas que tenho de Empada é a alegria das crianças quando nos viam a aproximar da casa delas... parece incrível, mas a nossa presença ali bastava para transformar alguma coisa. Não era precisa nada de especial, apenas o nosso tempo dedicado a elas...

Não é o tempo o ouro do futuro?



segunda-feira, novembro 17, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau


Acho que esta é uma das fotografias, das que tirei na Guiné, que gosto mais. Foi tirada no dia 28 de Julho de 2008 e tinha chegado à Guiné no dia anterior. Depois de uma noite cheia de humidade e calor, tomámos o pequeno almoço e saímos para Empada por volta das 9 da manhã.

Depois de muitos quilómetros de viagem chegámos a uma terra chamada Bambadinca onde há sempre muito comércio. Parámos para comprar batata doce (em Empada não há) e algumas mangas. Assim que o carro parou, as nossas janelas foram preenchidas por crianças a vender mangas, caju, batata doce, milho assado, bananas (tenho-me esquecido de fazer referência às bananas, que existem com alguma abundância por ali) e de repente, todo aquele cenário se transformou em algo inédito que me levou a tirar a máquina fotográfica. Várias crianças apareceram a rir, mas esta ficou assim... com aquele olhar sério...

... por momentos senti-me estranho... como se estivesse a invadir a privacidade dela... como se não tivesse o direito de lhe tirar esta fotografia...
... tinha vontade de comprar caju e mangas, mas ainda nem tinha francos no bolso... só uns euros em moedas. Nada feito. O jipe arrancou sem que eu tivesse comprado nada, mas logo a Ir.ª Anistalda nos mostrou as bananas que tinha comprado "lá fora" para enganar o estômago...

... arrancámos... mas aquele olhar ficou...


domingo, novembro 16, 2008

Vídeo: Guiné-Bissau | Video: Guinea-Bissau



Todos os dias gravava um clip de pouco mais de 1 minuto a relatar o dia.
A Ketta e a Patrícia também gravaram, mas esses clips são delas...

Para variar um pouco, aqui vai a minha partilha do dia 9 de Agosto de 2008...

... qualquer dúvida é só deixar um comentário...




quinta-feira, novembro 13, 2008

Diário Gráfico: Guiné-Bissau | Graphic Diary: Guinea-Bissau


Hoje estou tão cansado que não consigo escrever mais do que estas palavras...

... tentarei amanhã escrever sobre estes dois desenhos que ocupam o meu diário gráfico da Guiné.
13.Nov.2008 - 23:14


15.Nov.2008 - 20:18

Depois de muito pensar, decidi transcrever as palavras que estão no meu diário. Escolhi o dia 13 de Agosto. Nesse dia tinha escrito sobre a Franca, ela que aparece desenhada aqui duas vezes...

Todos os dias escrevia uma página no meu diário, o equivalente a sensivelmente um A5. Quando leio hoje o que escrevi lembro-me de pormenores que parecem levar-me para lá... pormenores que a escrita imortalizou...


Empada, 13 de Agosto de 2008

Hoje fizémos a entrevista à Safi. Como é pobre a Safi... chove dentro da sua casa...
Enquanto lá estava só conseguia pensar no modo como eu poderia ajudar esta mulher e as suas filhas lindas!
Todas passam fome, mas nenhuma se queixa. Hoje a Franca estava a comer o arroz que deveria ser para ela, para a Norma e para a Fámata. Em vez de dividir em três, começou a comer sem parar até quase nada restar para as irmãs. Quando elas chegaram, em vez de reclamar, comeram o que sobrava... em silêncio...
... que lição de vida se tem por aqui! As irmãs mais velhas deixam a mais nova comer mais porque sabem que ela precisa...
... enfim...

...
Amanhã a Patrícia vai dedicar-se às filmagens da vida das irmãs aqui por casa e vai fazer-lhes umas entrevistas. Eu e a Ketta estamos, portanto, mais livres. Vamos tentar corrigir todos os trabalhos de casa que temos dos nossos alunos...
...
Hoje acabei a ficha de registo para o Centro Nutricional da Ir.ª Franca! :)


segunda-feira, novembro 10, 2008

Diário Gráfico: Guiné-Bissau | Graphic Diary: Guinea-Bissau


Quando vi que o tempo se estava a esgotar, fiz uma lista das pessoas que queria desenhar. De repente essa lista tornou-se enorme e constatei que iria sair da Guiné sem a conseguir concretizar.

Uma das pessoas que queria desenhar era a Segunda.
A Segunda é uma das irmãs mais novas da Helena. Entre irmãos chamam-na de Segundinha, mas de "inha" não tem nada! Era alta, encorpada e adorava jogar futebol.

Um dia fui a casa da Segunda decidido a desenhá-la. Quando lá cheguei só lá estava ela. Preparava uma espécie de refugado para cozinhar o arroz. Não parava quieta! Pedi-lhe autorização para a desenhar... ela fartou-se de rir com ar desconfiado... depois lá disse que podia, mas ela não ia parar de andar de um lado para o outro...
Sentei-me num canapé e tentei começar o retrato, o que se revelou uma tarefa impossível para mim. Além dela não parar um segundo, não conseguia parar de rir!

Por tudo isto, optei por desenhar o ambiente da casa dela. Antes de chegar, uma tia tinha estado a lavar a roupa numa tábua de madeira. A roupa passa depois de alguidar em alguidar até ficar sem sabão. Finalmente é pendurada numas canas para secar ao sol. Ao longe via, penduradas, duas redes de pesca das mulheres...

No desenho não está o vermelho da terra...
No desenho não estão as cores diferentes de cada alguidar...

No desenho não estão as palavras da Sábado (mãe da Segunda e da Helena), que não percebia porque é que eu gastava tanto tempo a desenhar "coisas"...

sábado, novembro 08, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau


A Matilde de Empada...

... queria falar dela, mas não sei se devo...

A Matilde tem um sorriso lindo.
A Matilde trabalha mas não devia.
A Matilde é a mulher do Quintino, mas não pode ter mais filhos.
A Matilde é a mãe da Rosa, que tem um olhar triste e é raro esboçar um sorriso.
A Matilde não pode cozinhar porque não pode estar perto do calor.

A Matilde não apareceu no documentário por um triz. Esteve quase, quase...

quinta-feira, novembro 06, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau


Desde pequeno que me lembro da minha avó paterna dizer que, no seu tempo, uma sardinha dava para duas ou três pessoas...
... essas palavras ficaram gravadas na minha memória... acho que nunca consegui digerir bem a minha incapacidade para perceber como se podia viver dessa forma...

Quando um dia fui visitar a família da Helena, eram já umas três ou quatro da tarde, encontrei-os todos a comerem a sua refeição diária. Havia um rapaz que estava a comer arroz. Tirava de uma tijela algumas colheres de arroz branco. Enquanto conversava fiquei a observá-lo a comer... passado um tempo, o rapaz tira uma última colher de arroz, e, antes de a levar à boca, retira, com a ponta da colher, uma pequena parte de um peixe pequenino. Essa última colher de arroz levava algo mais do que arroz...

Quando terminou, o peixe estava praticamente intacto, faltava apenas aquela pequena parte que tinha tirado. De seguida ofereceu-me comida. Ofereceu-me o que tinha. Com alguma coragem disse-lhe que estava satisfeito e que não era necessário oferecer-me a sua comida.
Quando terminou, outra pessoa foi comer da tijela. Fez o mesmo ritual e no final retirou mais uma pequena parte do peixe...

E assim aconteceu repetidamente. Aquele peixinho pequenino alimentou várias pessoas.

Por momentos fiquei sem fala...
Por momentos lembrei-me da minha avó...

terça-feira, novembro 04, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau


Quando se entra num Hospital, é normal sentirmos um cheiro intenso a desinfectantes.

Quando pela primeira vez entrei no Hospital de Empada, o cheiro a desinfectantes não se sentia... o chão é num mosaico muito pequeno (parecido com as pastilhas de mosaico que se usam nas piscinas) e, de lavado, tem apenas uma água sem detergente que por ali passa de vez em quando.

Chegado aos quartos, a experiência fica mais intensa e perturbadora. O ar fica mais pesado, o cheiro é muito forte e por momentos pensamos que não vamos aguentar ficar ali mais um segundo...
... nos cantos das camas estão canas espetadas... por momentos não percebi a razão de ser daquela situação, mas logo o médico explicou que são as canas que seguram a rede mosquiteira, que se coloca durante a noite.

Fui várias vezes ao Hospital visitar doentes. Um deles já foi referido aqui no blog num comentário da Ketta - Arafam. Um dia escrevo sobre ele...

Das várias vezes que fui ao Hospital, ficava sempre a apreciar os cartazes que estavam fixados no átrio de entrada. Pensava entusiasmado para comigo: "é este o design de comunicação que se faz na Guiné"!
Um dia decidi fotografá-los, para que a memória não se perdesse. Sinceramente não sei se cumprem os seus propósitos, mas não deixam de ser um meio que tenta consciencializar para uma mudança de atitudes e mentalidades.

domingo, novembro 02, 2008

Diário Gráfico: Guiné-Bissau | Graphic Diary: Guinea-Bissau



Um dia, depois de ter dado uma aula de Português, cheguei à missão e sentei-me num dos bancos do Centro de Recuperação Nutricional. Tirei o meu diário gráfico e procurei algo para desenhar. As crianças seriam o ideal, mas mexiam-se tanto que tive medo de arriscar um desenho tão fugaz...
Olhei com atenção o que me rodeava até que finalmente encontrei o tema certo: a balança para pesar as crianças!

Eram raras as crianças que não choravam e berravam quando eram colocadas naquele pedaço de tecido devidamente cosido para ficar uma perna para cada lado. Agarravam-se à fita como se o mundo fosse acabar amanhã! Era um desespero... parecia que o facto de ficarem suspensas lhes alterava o metabolismo... de alguma forma deviam sentir-se inseguras...
Algumas das mais velhas já não estranhavam tanto... até alguns sorrisos esboçavam!

O Centro de recuperação Nutricional tem uma primeira fase de atendimento onde as crianças são pesadas nesta balança da Unicef, sendo registado depois um percentil que relaciona o peso com a idade da criança. Numa segunda fase a criança é também medida e efectua-se um registo da evolução do seu peso em relação a 15 dias antes.



O percentil é encontrado a "olho" recorrendo apenas a uma régua para um mínimo rigor. Quando vi esta situação comprometi-me a enviar uma máquina calculadora gráfica que conseguisse dar o percentil correcto. Já falei com uma amiga que se comprometeu a resolver esta situação. Espero enviar, agora no início de Novembro, a máquina calculadora e respectivas instruções de manuseamento.

Um pouco do que aprendi em Empada:

- quando uma criança tem um percentil abaixo dos 60%, significa que está numa situação de subnutrição grave e deve comer todos os dias uma papa especial que a Caritas Internacional envia;

- se o percentil estiver entre os 60% e os 80%, a criança está numa situação de subnutrição e deve comer todos os dias a papa que o PAM (Programa Alimentar Mundial) envia;

- acima dos 80% a criança é considerada reabilitada.

quinta-feira, outubro 30, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau



Proponho uma divagação literária à volta desta fotografia. Cada comentário poderá ter duas frases que tentem dar vida à imagem...

... começo eu...


terça-feira, outubro 28, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau



Acabei de falar para Empada.
Que emoção...
... ouvir uma voz tão familiar como a da Anistalda levou-me de imediato para aquele lugar distante...

Com palavras atrapalhadas lá fui falando do que precisava... informações...
... ela ia-me interrompendo, para saber novidades do concurso... se os alunos estavam entusiasmados, se estavam a trabalhar bem...
... disse-lhe que neste momento, Empada deve ser a aldeia da Guiné mais conhecida em todas as escolas portuguesas com 12ºano!

Fez-se um momento de silêncio e depois ela disse-me assim:
"Olha que o Liceu de Empada tem 426 alunos inscritos e o Jardim tem 100." eheh

Parece que o laboratório de Química e Física está adaptado a uma sala de aulas normal (porque têm muitos alunos e porque não têm material no laboratório).

... esclarecidas todas as dúvidas que precisava tirar, mandei grandes "manténhas" para toda a gente de lá...

... que saudades de Empada...


segunda-feira, outubro 27, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau



Quando o canapé está virado de lado ou de pernas para o ar, é sinal que não está ninguém em casa...

Assim que chegávamos a casa de alguém, um canapé era logo trazido para que nos pudéssemos sentar e ficar ali a conversar. Existem de vários tamanhos, desde muito pequenos até bem grandes, dando para se sentarem duas ou três pessoas. A estrutura é muito simples, mas a sua simplicidade não é de fácil reprodução. Só uma zona específica da Guiné tem as árvores com a madeira certa para fazer canapés.

A criança que está sentada neste canapé esteve ali largos minutos a brincar. Só tinha o canapé partido e a terra vermelha à volta, mas foi o suficiente para baloiçar, deitar-se, divertir-se...

Quando a cadeira da nossa casa se estraga, o normal é deitar fora e comprar outra. A ideia do terceiro R (Reduzir; Reciclar; Reutilizar) parece que por aqui ainda não saiu do papel, mas nem por isso deixa de ser colocada em prática onde os três R's ainda nem chegaram ao papel...


domingo, outubro 26, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau




Combinei com um grupo de alunos que me escreveu com dúvidas, que colocaria aqui algumas informações sobre Empada. Sendo assim, cá vão elas:

1 - Em Empada só existem dois locais com electricidade: a missão das Irmãs e um posto de serviço que não sei bem onde fica (mas é uma espécie de junta de freguesia). A electricidade existe porque estes dois locais têm geradores que transformam o gasóleo em electricidade. Existem também painéis solares na missão e no Hospital, mas o do hospital está avariado e não funciona...

2 - Existe um posto civil onde está o chefe de posto. Não sei muito bem, mas deverá equivaler ao presidente da junta, ou seja, compete-lhe fazer a "ponte" com as autoridades do governo. Existe também um posto de polícia (que tem um ou dois polícias, penso).

3 - Todas as pessoas que estudaram até ao 9º ano percebem relativamente bem o português. Isto acontece porque o português é a língua oficial da Guiné (embora a língua materna deles seja o crioulo) e todas as aulas são, portanto, em português. As crianças não percebem o português, mesmo as que vão à escola! Quem fala bem a língua de Camões, são as pessoas mais velhas que viveram a época colonial.

4 - A maior fonte de sustento das pessoas da Guiné-Bissau é a venda de Cajú, que acontece numa altura específica do ano. Este é o momento mais importante na economia das pessoas, porque o Estado Guineense compra todo o cajú que as pessoas recolherem (penso que para exportar) e é com esse momento que as pessoas ganham o dinheiro suficiente para garantir que podem comprar arroz (o alimento base das famílias). Depois disso, as pessoas têm uma agricultura de subsistência. Em Empada vendem o que sobra dessa agricultura no mercado da aldeia. Pode ser batata doce, milho, peixe, entre outras coisas.

5 - O mercado, a escola primária e o liceu, ficam dentro da aldeia de Empada.

6 - Segundo os dados de 2006 do governo, a aldeia de Empada tem cerca de 2500 habitantes. Cada família deverá ter em média entre 8 a 15 pessoas.

7 - Os principais utensílios agrícolas são a catana, a enxada, a pesca à linha e pesca com rede (aquelas que aparecem no documentário).

8 - Se uma pessoa perde a candonga tem de esperar pelo dia seguinte para viajar. A única alternativa é ter uma mota (caríssima) ou uma bicicleta (mais acessível, mas mesmo assim cara para uma pessoa de Empada). À esmagadora maioria das pessoas de Empada, só lhes resta andar a pé.

9 - O CRN e a Farmácia estão a poucos metros de distância (10/15 metros) um do outro, mas tanto estes como o Hospital estão mesmo na aldeia de Empada. No entanto são os únicos para todo o Sector de Empada: 82 aldeias (15 mil habitantes).

10 - As doenças mais frequentes são neste momento a Tuberculose, Malária e Sida.


E pronto! Aí estão muitas informações sobre Empada.

sexta-feira, outubro 24, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau



Alguém consegue adivinhar o que é isto?

(a Ketta e a Patrícia não podem responder)


... 5 dias depois ...



Um dia, quando íamos a caminho da casa da Matilde e do Sr. Quintino para entrevistar a filha mais nova deles, a Rosa, encontrámos duas senhoras sentadas por baixo do alpendre da casa a tirarem uma "massa" castanha de um alguidar e a moldarem-na numa esfera...

... o resultado final dessa moldagem manual eram umas esferas como as que estão na fotografia. Intrigados com aquilo decidimos aproximar-nos para perceber o que era aquilo. Numa primeira fase, riram-se de nós que não sabíamos o que aquilo era.
Depois lá nos disseram: são bolas de sabão para lavar a roupa.

Acho que nos explicaram como é que faziam esse sabão, mas sinceramente não percebi nada! Acho que fiquei demasiado intrigado com este sabão para ouvir qualquer outra coisa...



Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau



Gosto muito desta fotografia, muito mesmo, mas verdade seja dita, quem fez o clique aqui foi a Ketta.
Enquanto eu e a Patrícia entrevistávamos a Safi, a Ketta ficou a tirar fotografias às crianças. Esse era um dos poucos métodos que resultava para conseguirmos ter um pouco de calma à nossa volta e assim falarmos com mais à vontade com a Safi.

Na fotografia está a Cadijia, a filha da Sumai. A sua beleza é incandescente! Tem um sorriso lindo e uns olhos que nos prendem literalmente. É uma daquelas crianças que dá vontade de trazer para casa...


quarta-feira, outubro 22, 2008

Diário Gráfico: Guiné-Bissau | Graphic Diary: Guinea-Bissau



Este foi o segundo desenho que fiz em Empada. Estas árvores que aparecem estão completamente podadas, o que não é normal. Quando chegámos, a Ir.ª Emma disse-nos que dali a 15 dias as copas já estariam com muitas folhas, que quase não se notaria que tinham sido podadas. Achei aquilo muito estranho... como é que em 15 dias as copas das árvores iriam ficar cheias de folhas?

Ao fundo vê-se a palhota onde foi feito o debate com os jovens de Empada. Quando vi essa palhota pela primeira vez lembrei-me de uma fotografia do Gonçalo a dar aulas de viola nesse mesmo local, mas em 1997...

Antes de chegarmos, consta que essa palhota estava inabitável! Eram tantas as aranhas e insectos que se tornava impossível estar ali sentado à sombra. Parece que a solução para o problema passou pela "contratação" de um felino eficaz! O gato da missão chama-se Delmar (veio dos arquipélagos dos Bijagós através de barco), e num prazo de poucos meses conseguiu deleitar-se com tanta bicharada! Não havia aranha que lhe escapasse! Os lagartos (daqueles bem grandes) então, chamava-lhes um petisco! O empenho do Delmar foi de tal ordem que quando nós chegámos, a palhota era um dos locais onde as crianças permaneciam tranquilamente durante as tardes.

... depois de 15 dias em Empada as copas das árvores estavam muito bem compostas, e passadas 3 semanas quase nem parecia que tinham sido podadas!

Eu fiquei incrivelmente encantado com o poder do clima tropical.
O calor conjugado com a humidade faz verdadeiros milagres...

terça-feira, outubro 21, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau




Ando a entusiasmar-me com o texto e estes post estão a ficar muito grandes... depois já sei que ninguém lê...

Bom, as casas de Empada...

A grande maioria tem um telhado feito em palha. Essa palha resiste no máximo a duas épocas de chuva (dois anos portanto) e depois é necessário substituir tudo, senão começa a chover dentro...

Quem tem um pouco mais de posses tem telhados de zinco. Mas para ter esses telhados é preciso ter, não só dinheiro para comprar as placas de zinco, como também as traves em madeira, que têm necessariamente de ser mais resistentes que as outras (que só suportam a palha).

Artisticamente falando, as paredes são absolutamente fantásticas! A textura é fenomenal e as cores são incríveis. Representá-las no papel em aguarela seria um desafio emocionante...
... a parte mais triste das paredes é que se desfazem muito facilmente. Provavelmente o doseamento entre a areia e o cimento não foi bem calculado, ou então não havia dinheiro suficiente para comprar o cimento necessário.

O chão é também em terra.
O gado dorme dentro de casa. São poucas as famílias que já construíram uma divisão à parte para os animais.

Na casa da Safi só existe uma cama. A restante família dorme no chão... ou melhor, na terra...


segunda-feira, outubro 20, 2008

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau




Quando chegámos a casa da Safi para gravar o dia de trabalho da família ainda era escuro. São essas imagens que estão no início do documentário. Todo aquele cenário era tão fascinante que eu estava na dúvida entre tirar fotografias ou ficar petrificado a olhar para o que me rodeava. O fumo que saía por entre as palhas era lindíssimo... as crianças a acordarem saíam aos poucos de casa e começavam a vestir-se.
Quando a Sumai foi buscar água para lavar a loiça, as crianças aproveitaram a água para lavarem a cara e os dentes...
A Franca lavou os dentes com os dedos. Enquanto lavava os dentes olhava para mim e para a Patrícia. Eu tirei-lhe esta fotografia. A Patrícia gravou todo o momento.

Por esta altura nós já estávamos familiarizados com todos eles. Foi por isso que estas imagens saíram tão naturais...
Nos primeiros dias, quando chegávamos a casa da Safi, todas as crianças vizinhas se aproximavam a pedirem que tirássemos um postal (fotografia). Quase não se conseguia gravar nada. A única coisa que saía eram crianças super felizes a olhar para a câmara e depois para o pequeno visor, tendo como consequência uma risota pegada de alguns segundos.

A imagem que me fica dessas cenas é a do disparar do flash. O efeito imediatamente posterior era uma alegria de tal forma contagiante que só pensava em fazer mais um clique para ouvir tantas gargalhadas de tantas crianças!